Por Rachel Ann Hauser Davis, Bióloga, Doutora em Química Analítica pela PUC-Rio e professora e pesquisadora da UNICAMP.
Recentemente, a Bacia da Foz do Amazonas se tornou uma das áreas mais
desejadas das empresas internacionais interessadas na exploração de
petróleo, por conta da descoberta, no litoral da vizinha Guiana
Francesa, em 2011, de grandes reservatórios exploráveis de petróleo.
Antes de entrar no mérito dos possíveis – ou melhor, certos – impactos
ambientais nesta área, decorrentes deste tipo de atividade, devemos
analisar um pouco a região por um prisma geográfico e biológico.
A bacia amazônica abrange uma área de 7 milhões de km², compreendendo
terras de vários países da América do Sul (Peru, Colômbia, Equador,
Venezuela, Guiana, Bolívia e Brasil). É a maior bacia fluvial do mundo.
De sua área total, cerca de 3,89 milhões de km² (45%) encontram-se no
Brasil, abrangendo os estados do Acre, Amazonas, Roraima, Rondônia, Mato
Grosso, Pará e Amapá. A floresta amazônica, incluindo sua bacia
hidrográfica, é considerada patrimônio mundial pela UNESCO, e é a mais
rica floresta tropical do mundo em termos de biodiversidade (mais de um
terço de todas as espécies no mundo vivem nela). Lá se encontram uma das
maiores concentrações de água doce e enormes extensões de terras ainda
com cobertura florestal.
Em sua foz, o rio Amazonas se divide em dois braços: o braço norte é o
mais largo e corresponde ao verdadeiro estuário; o braço sul é conhecido
pelos nomes de rio Pará e baía de Marajó. No estuário, a floresta
encontra-se parcialmente inundada, com seus períodos de enchentes e
vazantes, os ecossistemas de várzea, manguezais e terra firme. É uma
enorme área composta pelas embocaduras dos rios Amazonas e Tocantins,
cuja biodiversidade apresenta altas taxas de fitoplâncton. É ainda a
zona de contato da água doce com a água salgada, dinâmica importante
para a vida no estuário, onde os recursos de água doce se alternam com
os do mar. Mais além, estuários são regiões consideradas como berçários
para a reprodução da biodiversidade aquática.
Agora que conhecemos mais acerca da bacia, pensando apenas nos impactos
mais óbvios deste tipo de exploração, como atividades mecânicas de
perfuração que causam erosão do solo, a liberação de material
particulado tóxico, as possibilidades de vazamento de óleo e a geração
de outros tipos de resíduos, contaminando os ecossistemas locais,
estamos praticamente implorando para iniciar o processo de degradação de
uma área frágil e extremamente importante em um cenário mundial.
Aliado a isso, ainda existe o fato da possível perda de vida humana
devido ao interesse puramente econômico de explorar uma área onde as
águas são extremamente revoltas. Há dois anos, por exemplo, uma sonda de
perfuração a serviço da Petrobras foi arrastada pela correnteza
presente na área. Nesse caso não houve vítimas, mas os riscos à
integridade física da tripulação, dos equipamentos e da segurança
ambiental levaram a companhia a abandonar o poço no último ano. O
desastre só foi revelado pela Petrobras em setembro de 2012, na
conferência Rio Oil & Gás, no Rio. Na época, o diretor de Exploração
e Produção, José Formigli Filho, minimizou o episódio e informou que a
sonda havia sofrido forte pressão da correnteza e apenas se inclinado,
sem ter se soltado da ancoragem. Agora, imaginem essa situação com
embarcações tripuladas, com a quantidade de trabalhadores necessários
neste tipo de empreendimento.
Caros leitores, eu lhes pergunto com toda a seriedade do mundo: vale
realmente a pena destruir um ecossistema deste tipo – um (ainda) refúgio
ecológico; onde se sabe muito pouco acerca das espécies (animais e
vegetais) presentes no local, que poderiam, por exemplo, nos fornecer a
cura para muitas doenças; e que foi eleita, em 2011, como uma das sete
novas maravilhas do mundo – em nome da exploração petrolífera? Faz
sentido?
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